3 de fev. de 2011

Mas você sabe o que está dizendo quando louva Maria?



Por Maria Emmir Nogueira, Comunidade Católica Shalom.
Revista Shalom Maná


Você já ouviu gente dizendo “Ave Maria cheia de “graçassssss”? Talvez achem que, acrescentando um “s”, estão acrescentando graças a Maria. Na verdade,apesar de sua boa vontade, estão diminuindo o fato de que Maria é plena, repleta da presença de Deus e a presença de Deus não se divide em partes que se posam contar no singular ou plural.


Outro costume engraçado é quando se intercede pelas ofensas, como se elas fossem capazes de agir por si mesmas. É quando se diz, no Pai Nosso, “perdoai as nossas ofensas”, como se diria “perdoai meu irmão, meu pai, minha mãe”. Na verdade, somos nós, os pecadores, que precisamos de perdão e não as ofensas. Elas não fizeram nada. Fomos nós que fizemos. Porém, para que isso fique claro, deveríamos dizer “perdoai-nos as nossas ofensas”.

Talvez nenhuma oração seja tão pouco compreendida como a Salve Ó Rainha, nome original da prece agora mais conhecida como “Salve Rainha”. No tempo em que São Bernardo compôs esta belíssima oração, era necessário colocar-se o “Ó” para honrar os reis e rainhas. Também naquele tempo – e ainda hoje – ser rei ou rainha significava ser o mais alto, belo e perfeito que alguém pudesse conceber. Ninguém chegava aos pés de um rei ou rainha. Por isso o vocativo “Ó”. Por isso, também, o “Salve” reverente, a saudação utilizada na época para os reis.

Nossa Rainha é também “Mãe de Misericórdia”. Isso mesmo, não “da misericórdia”, mas “de misericórdia”, que significa que ela, além de Rainha, é Mãe. Mãe de Jesus, e portanto Mãe de Deus e nossa Mãe. Nela, misticamente, fomos e somos continuamente gerados como Igreja, como filhos de Deus, como irmãos de Jesus Cristo.

Esta Mãe não é, porém, uma mera geratriz. Ela é cheia de misericórdia. Como toda boa mãe, a misericórdia, isto é, o perdão irrestrito, o interesse absoluto por nossas necessidades, a união com nossos corações, o incentivo a recomeçar sempre enchem seu coração sem deixar espaço para nenhuma mesquinhez.

É por isso que ela é “vida, doçura, esperança nossa”. Como dizem São Luis Grignon de Montfort e São Bernardo de Claraval, nas nossas situações mais difíceis e ainda que nada tenhamos para oferecer a Deus, podemos contar com a doçura de Maria, a nos apresentar ao Senhor que, ao ver quem nos apresenta, nem presta atenção às nossas faltas e feiúra tamanha é a perfeição e beleza daquela que nos apresenta e atrai seu olhar. Ela se torna, assim, nossa esperança e nossa vida unida a Cristo neste mundo e no outro. Vida eterna – Porta do Céu; doçura eterna – intercessora; esperança – gerada pela Mãe de Misericórdia, que jamais desiste de nós.

E o clamor dos degredados? É preciso lembrar. Nós, certamente, somos “degradados” pelo pecado que nos degradou e por nossa culpa em praticá-lo. No entanto, na “Salve Ó Rainha”, somos “degredados filhos de Eva”, isto é, enquanto vivermos aqui na terra, estamos em situação de “degredo”: ainda prisioneiros do pecado de Eva e fora da nossa pátria verdadeira que é o céu. Você se lembra quando o rei de Portugal, na época de nossa colonização enviou para cá os degredados? Pois é. Eram os prisioneiros expatriados dos quais Portugal se via livre enviando-os para a colônia além mar. Como estes, nós também estamos sofrendo o degredo. Por isso clamamos – não somente pedimos, mas clamamos, pois, como degredados, estamos em situação dificílima e nada podemos fazer por nós próprios. Clamamos à Rainha a misericórdia da Mãe, para que ela, Nova Eva, nos conduza ao céu.

Do clamor, passamos ao suspiro com gemidos e choro: “a vós suspiramos, gemendo e chorando neste vale de lágrimas”. O suspiro evoca a saudade do céu, o desejo de estar lá. Enquanto estamos aqui na terra, estamos como que em um vale cercado de montanhas e inundado de lágrimas, pois nela somos prisioneiros do pecado e do sofrimento que o pecado provoca. São o sofrimento e o pecado que nos fazem gemer e chorar nossa condição, da qual não temos como sair sem a ajuda de Maria que nos conduz à salvação conquistada por Jesus.

E o “Eia pois”? É português antigo. Hoje, talvez disséssemos: “É por isso”, ou “E então Advogada nossa”. Esta expressão é uma introdução ao que vamos realmente pedir. Até agora, saudamos a Rainha, louvamos suas virtudes e atributos e colocamos diante dela nossa situação de degredo e sofrimento. Neste ponto, dizemos que “por isso”, “diante dessa situação”, nós a constituímos nossa Advogada, isto é, alguém que fala em nosso nome, alguém que nos defende diante de Deus que é misericórdia, mas também justiça. E o que pedimos à nossa Advogada?

Primeiro, que olhe para nós: “Vossos olhos misericordiosos a nós volvei”. Que volte para nós seu rosto, seu olhar cheio de misericórdia. Em segundo lugar, que nos mostre Jesus depois de nosso degredo, de nosso desterro nesta terra, isto é, por ocasião de nossa morte: “e depois deste desterro, mostrai-nos Jesus”. Em outras palavras, estamos pedindo a Nossa Senhora que olhe para nós com misericórdia e nos leve ao Céu, que nos apresente a Jesus, que não nos deixe sozinhos no juízo, que esteja conosco na hora de nossa morte.

Ao falar de Jesus, que é o grande alvo desta oração tão bela, lembra-se a Maria quem Ele é: o bendito fruto do seu ventre. “mostrai-nos Jesus, bendito fruto do Vosso ventre”. (Aqui tem gente com mania de dizer “bendito é o fruto”, mas isso é dito na “Ave Maria” e não na “Salve Ó Rainha”.) Qual a mãe que não se derrete ao ouvir o nome do filho, especialmente quando é lembrada de sua gestação e, no caso de Maria, gestação milagrosa e felicíssima?

No final da oração, dizemos a Maria o que esperamos dela: clemência, isso é, misericórdia por ocasião do julgamento. Dizemos também porque esperamos dela esta clemência: porque ela é piedosa - isto é, íntima, amiga de Deus. Voltamos, então ao atributo de doçura, a que já nos havíamos referido antes com relação à apresentação que Maria faz a Deus de nossas necessidades: “ó clemente, ó piedosa, ó doce”.

Por fim, lembramos a Maria que Deus a preservou do pecado em sua alma e manteve a integridade do seu corpo de forma excepcional. Sua virgindade corporal antes, durante e depois do parto é sinal de sua concepção sem pecado: “sempre-virgem Maria”. Nossa Mãe e Rainha, como fez no Magnificat, se agrada de cantar conosco as maravilhas que Deus fez nela.

Que tal rezar agora, em homenagem à Rainha que celebramos no dia 22 deste mês de agosto, uma “Salve Ó Rainha” bem rezada, sabendo o que estamos dizendo?

Fonte: Shalom

Pax et Gaudium